Durante a maior parte da 2.ª Guerra Mundial, os alemães não
mobilizados para a frente continuaram a levar uma vida normal, pois
nunca faltaram matérias-primas às fábricas ou alimentos às famílias. A
guerra trava-se lá longe, sem afectar o pacato quotidiano dos cidadãos.
Os alemães não sabiam, nem cuidavam de saber, que a sua prosperidade
assentava na pilhagem organizada dos recursos da Europa inteira.
"Não
saber" o que não lhes convém saber é, como a actual crise europeia veio
recordar-nos, um dos pontos fortes dos alemães. A Europa afunda-se na
recessão duradoura, a pobreza renasce em países onde se tornara
residual, metade dos jovens não encontra trabalho –, mas, na Alemanha, o
Natal foi vivido na paz do Senhor, e isso é tudo o que importa.
Qualquer
pessoa sensata entende que, um dia, o sofrimento chegará também à
Alemanha. Não, desta vez, sob a forma de bombardeamentos mortíferos, mas
de estagnação e desemprego induzidos pelo empobrecimento dos parceiros
europeus, visto que 60% das exportações germânicas se dirigem à União
Europeia e 40% à Zona Euro. Entretanto, como regularmente faz notar
Wolfgang Munchau (colunista do Financial Times e ele próprio alemão), na
República Federal reina a cegueira absoluta, imune aos avisos que
chegam de todas as partes do mundo sobre a tacanhez da política adoptada
por Angela Merkel.
O ponto inquestionável é que a
União Europeia mudou de natureza, tornando-se numa coutada da Alemanha, a
qual, mercê da sua dimensão geográfica, populacional, económica e
financeira, se encontra de momento em condições de impor a sua vontade a
todo o continente. Quanto maior o poder de que um país dispõe, mais
necessário será que aja com autocontenção, mas a Alemanha parece
apostada em demonstrar em todas as oportunidades ser um país em que
ninguém pode confiar, dado que não só desrespeita os compromissos que
assume, como infringe sempre que lhe convém as regras da União Europeia.
Toda a gente se recorda como incumpriu o PEC; como ignorou as regras da
concorrência socorrendo a sua indústria automóvel durante a recessão de
2009; como sabotou o funcionamento das instituições europeias; como
condicionou publicamente a actuação do BCE; como se arrogou poderes de
decisão que não lhe competem; como interferiu na política interna dos
outros países membros, chegando ao ponto de fazer e desfazer governos;
como, enfim, recentemente impôs o adiamento dos compromissos assumidos
com os outros países em relação à projectada união bancária.
O
que tem este novo Sacro Império Germânico que ver com a União Europeia
que nos empenhámos em construir nas últimas décadas? Nada, como é
evidente. Porque haveremos então de continuar a fingir que a União
Europeia continua a existir? Os britânicos serão provavelmente os
primeiros a decidir que não estão dispostos a ser comandados pela
Alemanha, mas é possível que, a prazo, se lhe sigam a Itália, a Espanha
e, por último, a própria França. Com a Alemanha ficarão decerto a
Áustria (consumando por fim o adiado Anschluss) e a Holanda (uma
gigantesca plataforma logística da Renânia-Vestefália). Quanto à
Polónia, com uma longa experiência do que a casa gasta, não tardará a
pôr-se a milhas.
Por cá reina a ilusória esperança
de que, no intuito de salvar o euro, o bom senso acabará por ditar o
aprofundamento da união, e que isso inevitavelmente implicará uma
espécie de federação democrática. No horizonte dessa esperança
encontram-se a união bancária, a união fiscal e a mutualização parcial
das dívidas (vulgo eurobonds). No fim desse radioso caminho
esperar-nos-ia, finalmente, a desejada união política. Valeria, assim, a
pena sujeitarmo-nos a todas as sevícias concebidas pela troika. Sucede,
porém, que, quando apreciou o Tratado de Lisboa, o Tribunal
Constitucional Alemão recusou liminarmente a perspectiva da diluição da
soberania germânica num futuro estado federal europeu. Nessas
circunstâncias, o federalismo de que tanto se fala poderá ser
burocrático e financeiro; mas jamais político, menos ainda democrático.
Não haverá nele lugar para a consideração dos interesses particulares de
povos como nós.
De 1910 até quase ao fim do século
XX, Portugal cresceu quase sempre mais do que a Europa e, em particular,
do que a Espanha. Dir-se-ia que, apesar de consideráveis erros
cometidos ao longo de três regimes políticos diversíssimos, soubemos
governar-nos. Foi então que optámos por subcontratar partes cada vez
maiores da nossa política económica à União Europeia – processo coroado
com a adesão ao euro – e o resultado está à vista.
Por
muito nefasta que nos seja esta circunstância, não está evidentemente
nas nossas mãos tomar agora a iniciativa de sair do euro. Mas um mínimo
de lucidez recomenda que nos questionemos sobre o que estamos nós aqui a
fazer – e que comecemos a ponderar, à luz dos nossos interesses
geoestratégicos, que alianças alternativas deveremos buscar caso se
confirme o presente rumo de desagregação da União Europeia.
Os números que Marques Mendes não mostrou
Há 13 horas
3 comentários:
racionamento de matérias gordas para produção de nitroglicerina significa menos gordura nas dietas
menos gente nos cAmpos significa menos fruta menos etc...
1940 não é 2012 cheio de pitroil pra fazer gasoil para os tractores
a maioria dos quais era a vapor
apesar de para um avocat ser un bom argumento
o facto de ser falso
e o facto do número de tuberculosos ter aumentado em 1940-1942 prova que a rectaguarda tinha muita fomeca
não era para todos claro...
De 1910 até quase ao fim do século XX, Portugal cresceu quase sempre mais do que a Europa essa unidade abstracta que se fala em geral mas que foi destruida duas vezes no tal século economicamente e demograficamente e, em particular, do que a Espanha que apesar de tudo tinha uma indústria florescente nos anos 30 apesar de ter perdido as colónias em 1898 manteve uma frota mercante e pesqueira pouco usual em potências decadentes . Dir-se-ia que, apesar de consideráveis erros cometidos ao longo de três regimes políticos diversíssimos afonso costista sidonista e soarista-cavaquista?
pois pleno de erros político económicos
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